Diferença entre Abandono:
Afetivo, Material, de Incapaz e Intelectual
A Constituição Federal em seu Artigo 227, regulamenta que: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”.
Já no Artigo 229, estabelece que: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. (cfr. Constituição Federal: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm ).
Contudo, as pessoas hoje em dia estão com uma rotina extenuante, entre vida pessoal e trabalho, mesmo para os casais que se auxiliam, por vezes fica difícil despender atenção total aos filhos, ou aos demais parentes.
Crianças e Idosos, primam por afeto e cuidado, e a falta de tempo não caracteriza desculpa para omissão aos cuidados, assistência e companhia desses entes familiares, isto porque, poderão os pais em relação a seus filhos menores, ou, os filhos em relação a seus pais idosos, incorrer no Abandono Afetivo, e em situações extremas nos crimes de Abandono Material ou Abandono de Incapaz.
Objetivando uma melhor compreensão sobre a questão, define-se o Abandono Afetivo como sendo a omissão aos cuidados da criação, companhia e assistência moral, psicológica, social, religiosa, educacional e afetiva, que os genitores e / ou responsáveis legais devem às crianças ou aos adolescentes.
Na hipótese de os genitores serem casados ou viverem juntos, e esses não darem o mínimo de atenção e cuidados aos filhos, acabando por desprezá-los completamente, seja nos afazeres escolares, nas brincadeiras, ou nos eventos sociais, incorrerão esses pais no Abandono Afetivo.
Inclusive, esses genitores, também praticarão o Abandono Afetivo, quando delegarem suas atribuições a outros parentes ou funcionários, ocupando-se exclusivamente com seus trabalhos ou sua vida social, não se interessando pela companhia de seus filhos.
Quando separados, poderão incorrer no Abandono Afetivo, o pai ou a mãe, que não aceitar o filho e demonstrar seu desprezo por ele, razão pela qual, nunca o procura ou lhe visita, mesmo que tenham sido regulamentadas as visitas em sede de um acordo de divórcio.
E ainda, o responsável pela visitação incidirá no Abandono Afetivo, se não cumprir os horários estabelecidos na avença, fazendo promessas de encontros ou reuniões com a criança ou o adolescente, sem, contudo, honrá-las.
Relativo ao Abandono Afetivo Inverso, é certo que, nessa modalidade de abandono, a falta de cuidado, companhia, e assistência moral, psíquica e social, ocorre pelos filhos em relação aos genitores idosos.
Na ordem emocional ocorre o Abandono Afetivo Inverso quando o praticante não dá atenção nem visita o ente familiar, ou na ordem material quando o desamparo incide na ação ou na omissão de dar provimento na subsistência da pessoa com mais de sessenta anos de idade.
Exemplo disso, quando os filhos não ligam, não enviam mensagens, e não visitam o genitor, que muitas das vezes torna-se senil ou detentor de enfermidades sem que tenha os cuidados necessários.
Também se dá o Abandono na modalidade Inversa, quando o pai ou mãe na velhice não recebe aposentadoria ou seus proventos são tão poucos que não consegue se manter monetariamente, e seus filhos não lhe auxiliam na parte financeira, deixando-o à mercê da sorte e do destino.
Vislumbra-se pelas exemplificações, que diversas são as ocorrências e graus do Abandono Afetivo, seja ele o clássico em relação às crianças e aos adolescentes, os quais se encontram em formação por ocasião da tenra idade, ou o inverso, promovido em face dos idosos que apresentam senilidade, e o que se percebe em todas as modalidades, é que os genitores ou os responsáveis legais deixam de agir conforme se espera deles, e isso acaba por acarretar danos irreparáveis aos abandonados.
A prática do Abandono Afetivo poderá gerar ao agente uma penalização no âmbito civil que se traduz pelo pagamento de uma indenização à título de danos materiais e/ou morais, além de poder responder pelos crimes de Abandono Material (Art. 244 do CP), Abandono de Incapaz (Art. 133 do CP), ou Abandono Intelectual (Art. 246 do CP). (cfr. Código Penal: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm )
Alguns tribunais não estão decidindo em uníssono quando o assunto é Abandono Afetivo, há decisões no sentido de que não se pode impor juridicamente que alguém ame outra pessoa, nem que lhe dê atenção ou carinho.
Demais disso, o Abandono Afetivo, se distingue do Abandono Material, do Abandono de Incapaz e do Abandono Intelectual. (cfr. https://cnj.jusbrasil.com.br/noticias/222926205/entenda-a-diferenca-entre-abandono-intelectual-material-e-afetivo ).
Ocorrerá o Abandono Material quando o responsável legal, não cumpre com seu dever de assistência familiar, conforme previsto na Constituição Federal, deixando de garantir a vida, a saúde, a alimentação, e o desenvolvimento do filho, do parente, ou do ascendente maior de 60 (sessenta) anos ou inválido.
Conforme o Artigo 244 do Código Penal, temos como Abandono Material o ato de: Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo, sendo o agente condenado a pena de detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País.
No que tange ao Abandono de Incapaz, ele se dá quando o responsável pela vigilância, guarda, autoridade ou cuidado, abandona o sujeito incapaz, o qual segundo a lei não consegue se defender dos riscos do abandono.
Inclusive o Código Penal em seu Artigo 133, trata do Abandono de Incapaz, e preleciona que, o crime se caracteriza por abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono, culminando assim, na pena de detenção, de seis meses a três anos.
No § 1º fica estabelecido que, se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave, a pena será de reclusão, de um a cinco anos.
Já no § 2º, se do crime, resulta a morte da vítima, a pena será a de reclusão, de quatro a doze anos.
Demais disso, haverá o aumento da pena de um terço, conforme o § 3º:
I – se o abandono ocorre em lugar ermo;
II – se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima.
III – se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos.
De acordo com a Central Judicial de Idosos (CJI), o número de denúncias contra idosos nos primeiros cinco meses de 2021 superaram as promovidas no ano de 2020 inteiro. O que é alarmante e preocupante, além de gerar uma necessidade de conscientização familiar junto às alterações legislativas para agravamento das sanções.
Quanto ao Abandono Intelectual, essa prática ocorrerá quando o pai, a mãe ou o responsável legal deixar de garantir a educação primária de seu filho sem justa causa, incidindo assim o agente, também em crime contra a assistência familiar.
No Artigo 246 do Código Penal, traduz-se o Abandono Intelectual como, deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar, sendo a pena de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
O objetivo da norma é o de garantir que toda criança ou adolescente tenha direito à educação, evitando-se com isso a evasão escolar.
Contudo, observa-se quanto às modalidades de Abandono que, eventual responsabilidade criminal ou condenação ao pagamento de reparação civil não diminuiria ou induziria a cessação da dor do abandonado, estar-se-ia diante de uma sensação de justiça tão somente, o que não elimina nem soluciona o conflito.
E como solucionar os conflitos provenientes de Abandono?
Encontrando-se em conflito por ocasião de uma situação de Abandono, poderão os envolvidos de forma preventiva procurar pela Mediação.
Havendo vontade dos conflitantes, designa-se uma sessão de Mediação, onde serão aplicados os meios e técnicas necessárias para que os mediandos consigam entender do conflito e sua natureza, encontrando possíveis resultados, chegando de forma conjunta a uma solução pacífica da questão, levando o pactuado à homologação.
Na hipótese de as partes-conflitantes terem procurado inicialmente a Justiça, sendo da vontade dos litigantes, poderão optar pela Mediação, na modalidade judicial ou extrajudicial, solicitando ao magistrado que antes de prolatada uma sentença, a discussão dos autos seja levada a uma sessão de conciliação, para a tentativa de composição, e existindo acordo este será levado à anuência da promotoria e após à homologação do juiz da causa.
Ressalta-se que, a omissão aos cuidados da criação, companhia e assistência moral, psicológica, social, e afetiva, podem gerar aos envolvidos no abandono, principalmente nos abandonados, além da necessidade de participação em uma Mediação, a da realização de um tratamento multidisciplinar, utilizando-se de terapias e oficinas de parentalidade, nas quais os envolvidos na questão conflituosa saberão como agir diante da circunstância de proteção da criança, do adolescente, do idoso, ou do parente, refletindo esse tratamento de forma positiva e significativa no convívio familiar, reforçando ainda mais os vínculos de parentalidade existentes.
Porém, se do abandono resultou um delito, poderão os envolvidos participar de um círculo restaurativo, cuja prática desse mecanismo é ampla, conjugando um procedimento que propõem a resolução do conflito a partir dos valores e princípios envolvidos, resgatando o convívio das partes na sociedade e no ambiente contaminado pela violência e pela injustiça.
Conclusão
Da leitura do artigo se conclui que, diversas são as ocorrências e graus do Abandono, seja ele o Afetivo, o Material, o de Incapaz, ou o Intelectual, podendo se dar em relação as crianças que estão em formação, ou contra o adolescente, e ainda, em face de um idoso, ou demais parentes, e nessas hipóteses percebesse que a omissão aos cuidados, a companhia e a assistência moral, psicológica, social, e a afetiva, acarretam danos que podem ser irreparáveis aos abandonados.
Outrossim, eventual responsabilidade criminal ou condenação ao pagamento de reparação civil não diminuiriam ou induziriam a cessação da dor dos abandonados e das vítimas, mas tão somente estar-se-ia diante de uma sensação de justiça, o que em si, não elimina ou pacífica o conflito.
Demais disso, percebeu o leitor que, de forma preventiva a Mediação poderá ser um meio de solução dos conflitos relacionados ao Abandono dos filhos, dos pais idosos, ou do parente, e que poderão os abandonados se valer da Mediação, bem como, de um tratamento multidisciplinar e de oficinas de parentalidade para identificar eventual conflito, tanto no aspecto legal quanto no emocional, e via de consequência como resultado encontrar eventuais soluções das questões.
E ainda, se do abandono resultou um crime, poderão os envolvidos participar de um círculo restaurativo, atingindo a resolução do conflito a partir dos valores e princípios envolvidos, resgatando o convívio das partes na sociedade e no ambiente contaminado pela violência e pela injustiça, reforçando-se os vínculos familiares, e atingindo-se o bem-estar físico, e a plena saúde mental dos envolvidos.
E aí gostou? Quer saber mais sobre Mediação na área de Família?
Dúvidas e/ou Sugestões em: www.apamec.org.br ou contato@apamec.org.br
ANSELMO CALLEJON CORRÊA DOS SANTOS, Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil pela ESA OABSP (2009), Mediador e Conciliador Judicial desde (2016), associado da APAMEC e comentarista do Jornal APAMEC na especialidade de Mediação Familiar. Contato: anselmocallejon@hotmail.com