Regulamentação de guarda, pensão, visitas, moradia e convivência do menor quando viaja ao exterior
Conforme pontuamos em programas anteriores, o casal que rompe o relacionamento, poderá regulamentar não só as questões do fim do casamento ou da união estável, mas da guarda, pensão alimentícia, direito de visitas e convivência dos filhos.
Quando os pais moram na mesma cidade ou em comarcas contíguas fica de certo modo mais prático o cronograma da regulamentação de convivência dos genitores com os menores.
Estabelecida uma rotina do dia a dia da criança ou adolescente, os pais se revezam entre as idas e as vindas da escola, cursos extracurriculares, consultas médicas, dentre outros afazeres e localidades.
Depois que foi deflagrada a pandemia do COVID-19, alguns pais passaram a conviver com seus filhos de forma on-line, o que acabou por facilitar em alguns aspectos o direito de convivência entre esses familiares, que começaram a trabalhar e estudar de dentro de seus lares.
Algumas famílias tiverem que buscar o poder judiciário para regulamentar essas novas formas de interação, para coibir eventual impedimento de contato e convívio.
Recentemente a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, o qual havia afastado a guarda compartilhada em virtude da distância que se estabelecia entre as casas do pai e da mãe dos menores, decretando a guarda unilateral à mãe.
Contudo, a Ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso do pai perante o STJ, proferiu na sua argumentação que o avanço dos meios de comunicação à distância, torna viável a guarda compartilhada em casos como o em apreço, afirmando que: “Não existe qualquer óbice à fixação da guarda compartilhada na hipótese em que os genitores residem em cidades, estados ou, até mesmo, países diferentes, máxime tendo em vista que, com o avanço tecnológico, é plenamente possível que, a distância, os pais compartilhem a responsabilidade sobre a prole, participando ativamente das decisões acerca da vida dos filhos”.
As tutelas de urgência se avolumaram perante as Varas dos Fóruns, para que se garantisse o direito desses pais e dessas mães de poder ver seus filhos mesmo que por videoconferência.
A garantia do direito dos genitores foi deferida, quando esses demonstraram efetivamente que a rotina da criança permaneceria organizada, com a convivência regulamentada em relação às videochamadas serem realizadas em dias e horários previamente fixados.
Alguns argumentos como a tenra idade da criança ou a inabilidade da criança em manusear os equipamentos não foram suficientes para afastar o pleito dos pais.
No TJSP em um processo que corre em segredo de justiça, o desembargador Claudio Godoy ponderou que: “Já não fosse a ausência de oposição ao pleito, reitera-se que o que se pretende preservar é justamente o melhor interesse da criança em construir uma relação com o pai, que se encontra afastado da convivência física por motivos de trabalho”.
Garantiu-se assim, que o pai veja o filho de forma telemática mediante o uso dos aplicativos Skype ou Facetime, e na inoperância desses programas outro meio idôneo de videoconferência. (cfr. https://www.migalhas.com.br/quentes/307322/pai-que-vive-no-exterior-consegue-regulamentacao-de-contato-com-filho-via-skype-ou-facetime ).
Além das determinações alimentares constantes da decisão que regulamentou as visitas, deverá o pai, a mãe, ou o responsável legal que mora no exterior cumprir efetivamente a sentença, pagando os alimentos, e na inexecução desta, poderá ser deferida a citação mediante carta rogatória à autoridade judiciária no exterior, para que se promova o efetivo cumprimento da obrigação alimentar.
Quanto a guarda da criança, independentemente de ser exercida unilateralmente por um dos genitores, ou ser compartilhada entre os pais, a autorização para que essa criança vá viajar, residir, ou estudar fora do País, na companhia da mãe ou do pai, deverá ser deferida por autoridade judicial, e sempre sendo analisado o melhor interesse do menor.
Nancy Andrighi durante julgamento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em que uma mãe teve o pleito de ir para o exterior com os três filhos negado pelas instâncias inferiores, ponderou em seu voto que: “se tratava de um dos processos considerados “dolorosos”. Os autos trazem laudos psicológicos que comprovam os profundos danos emocionais sofridos pelas crianças em razão da disputa entre os pais”.
Asseverou ainda que: “os requisitos para sua concessão não estavam presentes …, não houve demonstração de violação ao Estatuto da Criança e do Adolescente, e não há perigo de dano, … em momento oportuno e com mais maturidade, os menores poderão usufruir experiências culturalmente enriquecedoras sem o desgaste emocional de serem obrigados a optar entre dois seres que amam de forma igual e incondicional”. (cfr, https://www.conjur.com.br/2010-fev-04/criancas-guarda-compartilhada-nao-podem-mudar-outro-pais ).
Nesse julgamento a genitora teve seu pedido negado por unanimidade de votos, porque, de acordo com os ministros: “o casal exerce guarda compartilhada e um não pode privar o outro do convívio social com os filhos”.
A 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em posicionamento diverso do anteriormente mencionado, manteve a guarda compartilhada de duas crianças cuja genitora se mudou para o exterior, sendo determinado que a residência das crianças deverá ser alternada bienalmente entre os genitores.
Os magistrados lembraram o §2º do artigo 1.584, do Código Civil, introduzido pela Lei 13.058/2014, que define a guarda compartilhada como regra: “Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor”. (cfr. https://www.conjur.com.br/2021-abr-20/pais-residentes-paises-diferentes-podem-guarda-compartilhada ).
Demais disso, a autorização para viagem ao exterior foi regulada pela Lei nº 13.812/2019 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13812.htm#art14), quando da criação da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas e do Cadastro Nacional de Desaparecidos, culminando com a alteração da Lei nº 8.069/90, conforme dispõe o artigo 83 e seguintes, do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm).
Quando a viagem for para território internacional, a autorização dos genitores forma requisito essencial à criança ou ao adolescente menor de 17 anos, estando esse desacompanhado, ou na companhia de terceiros, ou ainda, acompanhado apenas de um dos genitores, (https://www.cnj.jus.br/autorizacao-de-viagem-de-criancas-e-adolescentes-ficara-mais-facil-com-documento-eletronico/).
Devendo os genitores se atentar para o fato de que, se a criança ou o adolescente for viajar ao exterior na companhia de uma terceira pessoa, e essa for estrangeiro, a autorização judicial será indispensável.
Referida autorização dos genitores quando estiverem em consenso, será realizada mediante escritura pública, com reconhecimento de firma da assinatura, e esse documento deverá ser redigido em duas vias de igual teor, o qual poderá ser emitido on-line com firma reconhecida pelo e-Notariado, (https://www.gov.br/pt-br/noticias/transito-e-transportes/2021/07/autorizacao-para-viagens-de-menores-desacompanhados-podera-ser-feita-online).
Evita-se com isso a ausência de convívio da criança com um dos genitores em razão de morar longe, em outra cidade, ou país, e mesmo que essa convivência se dê por meios telemáticos, caberá advertir a outra parte, com quem o menor mora, que deverá promover essa interação do filho com o outro genitor, para não ocorrer eventual alienação parental, nem a incidência de descumprimentos legais ou a prática de crimes de sequestro.
Inclusive o Brasil é signatário da Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, concluída na cidade da Haia, em 25 de outubro de 1980, e promulgada pelo Decreto n. 3.413, de 14 de abril de 2000; bem como da Convenção Interamericana sobre a Restituição Internacional de Menores, adotada em Montevidéu, em 15 de julho de 1989 (Decreto n. 1.212, de 3 de agosto de 1994).
Ambas as Convenções têm como objetivo a proteção da criança que foi subtraída do local da sua residência habitual por um dos seus genitores, sem a autorização do outro, retornando-a ao seu país de origem, para que ali possam então ser resolvidas as questões relativas à sua guarda e direito de visitas. (https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios-1/publicacoes-1/outras-publicacoes/manual-haia).
Válido lembrar que, a referida autorização judicial será obrigatória para crianças e adolescentes, nas hipóteses em que:
– Um dos genitores está impossibilitado de dar a autorização, por razões de já se encontrar viajando, por doença ou por estar em paradeiro ignorado; e,
– Quando a criança ou o adolescente nascido em território nacional viajar para o exterior na companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior, mesmo se houver autorização de ambos os pais.
Observa-se que, os interessados em viajar devem realizar o requerimento conforme os formulários disponíveis no sítio do site da Polícia Federal do Brasil. (http://www.pf.gov.br/servicos-pf/passaporte/documentacaonecessaria/documentacao-para-passaporte-comum/documentacao-para-menores-de18-anos).
E para mais informações deverão consultar também o portal do Ministério das Relações Exteriores (http://antigoportalconsular.itamaraty.gov.br/cartilhas/cartilha-sobre-viagens-de-menores-ao-exterior ) e a Cartilha do Conselho Nacional de Justiça (https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2019/09/69a4edf47f9bee943e814f0d62446eec.pdf ).
Oportuno que as partes primem por um diálogo quanto a projeção dessa viagem, de lazer, estudo, ou mudança do filho ao exterior, com a parte que detém a guarda do menor, ou dela compartilhe em igual condição, visando o melhor interesse do menor, sendo preservado o bem-estar físico e mental da criança e do adolescente.
Contudo, não havendo essa disposição de vontade, poderão as partes envolvidas nessa questão, se beneficiar da Mediação, que é um método adequado de resolução de disputas, além de consultar um advogado ou defensor especialista na matéria, para entendimento dos dilemas trazidos pelo conflito e estabelecer qual o melhor caminho a seguir na solução do dilema.
A Mediação como instrumento de pacificação do conflito.
Os pais, as mães, e os demais responsáveis pelos menores, que não estejam em sintonia com a criação das crianças e se encontrem num conflito de interesses, em especial no que se refere a regulamentação de visitas ou a moradia e a convivência com o menor em viagem para o exterior, ao invés de judicializar imediatamente a questão, poderão usar da Mediação Familiar como forma preventiva de resolução das controvérsias.
As partes-conflitantes com o auxílio de seus advogados ou defensores, buscarão por um mediador-independente, ou uma câmara de mediação, e os profissionais dessa área, irão esclarecer aos mediandos sobre a Mediação, os caminhos a serem percorridos, os princípios e as técnicas que regerão os trabalhos, convidando-os a fazer parte do processamento da tentativa de composição.
Havendo vontade dos envolvidos, será designada uma sessão ou sessões de mediação, que poderão ser presenciais ou telepresenciais, momento em que serão aplicados os meios e técnicas necessárias, com o objetivo de que os envolvidos, conjuntamente cheguem à resolução pacífica da questão.
Caso haja um processo em andamento, sendo de interesse dos litigantes, eles poderão optar pela Mediação, no âmbito judicial ou extrajudicial.
Nessa hipótese, caberá aos procuradores peticionar ao juízo, requerendo que antes de proferida a sentença, sejam os dilemas relativos ao conflito levados a uma sessão de Mediação, para a tentativa de composição, e existindo acordo este será levado ao juiz para homologação.
Portanto, optando os conflitantes pela Mediação como forma de solucionar seus conflitos, se depararão os mediandos com as fases de uma sessão, em que serão aplicados os princípios e as técnicas, tornando mais ágil e efetiva a busca pela solução e pacificação das questões e relações dos envolvidos, dirimindo sobre diretos e deveres.
Garantindo-se assim, a segurança jurídica do que fora entabulado, razão pela qual os envolvidos indistintamente saem ganhando quanto ao relacionamento e convívio entre genitores e filhos, e resolvendo o conflito por intermédio de uma composição, ela será registrada em um termo de sessão e poderá ser levada a homologação pela autoridade.
Conclusão
Percebeu o leitor que, os relacionamentos nem sempre serão duradouros, mas os filhos e a condição de ser pai ou mãe são para a vida toda, e por ocasião de controvérsias, havendo a necessidade de regulamentar a guarda das crianças e o direito de visitas, moradia ou convivência no exterior, a guarda compartilhada do menor e sua fixação serão regra, mesmo quando não houver acordo entre os genitores ou quando os pais residam em cidades ou países diferentes e distantes, face ao avanço dos meios de comunicação à distância.
Referida modalidade de regime de guarda não exige a permanência física da criança ou do adolescente, em ambas as moradias e admite a flexibilização na definição da forma de convivência com os genitores, sem que se afaste a igualdade na divisão das responsabilidades.
O que se deve evitar é a ausência de convívio da criança com um dos genitores em razão de morar longe, em outra cidade ou país, e mesmo que essa convivência se dê por meios telemáticos, caberá advertir a outra parte, com quem o menor mora, que deverá promover essa interação do filho com o outro genitor, evitando assim a incidência de eventual alienação parental.
Busca-se com isso primar pelo melhor interesse do menor, sendo preservado o bem-estar físico e mental da criança e do adolescente.
Esclareceu-se também sobre a Mediação, apresentando-a como um dos métodos mais adequados de resolução das controvérsias dessa natureza, em que se busca a pacificação das famílias, do ambiente familiar, e da convivência entre todos de forma harmônica, mesmo que a interação seja estabelecida em cidades ou países diferentes.
E aí gostou? Quer saber mais sobre Mediação na área de Família?
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WERA LUCIA MUNIZ, Advogada, Conciliadora e Mediadora Judicial com capacitação nos termos da Resolução nº 125/2010 CNJ, atuante no CEJUSC de OUROESTE SP, associada e colaborada da APAMEC, e comentarista do Jornal da TV APAMEC. Contato: wera.lucia.muniz@terra.com.br
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ANSELMO CALLEJON CORRÊA DOS SANTOS, Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil pela ESA OABSP (2009), Mediador e Conciliador Judicial desde (2016), associado e colaborador da APAMEC, comentarista do Jornal da TV APAMEC na especialidade de Mediação Familiar. Contato: anselmocallejon@hotmail.com