Filiação Socioafetiva o que é?
Há alguns anos no Brasil só se reconhecia a filiação proveniente da consanguinidade ou a filiação oriunda da adoção.
Contudo, à medida que a sociedade e o direito evoluíram, a filiação acompanhou essa modificação, razão pela qual atualmente a legislação brasileira regulamenta o parentesco, e o reconhece proveniente de três formas:
– Filiação natural, em virtude do vínculo biológico, nessa modalidade de parentesco, os laços dos pais com os filhos são formados pela consanguinidade de primeiro grau;
– Filiação inatural, não há vínculo biológico pré-existente, mas um vínculo civil que se estabelece, o parentesco dos pais com os filhos resulta da manifestação de vontade dos envolvidos na adoção, em conjunto com uma sentença judicial; e a,
– Filiação socioafetiva, não há vínculo biológico pré-existente entre a mãe ou o pai socioafetivo e o filho, mas um vínculo familiar de afeto, respeito e proteção, que se estabelece entre pais e filhos, resultando o reconhecimento da manifestação de vontade dos envolvidos na parentalidade por socioafetividade, em conjunto com um procedimento perante o cartório de registro civil das pessoas naturais mais próximo;
As modalidades de filiação mencionadas são protegidas pelo Estado, face ao princípio da dignidade da pessoa humana e a proteção da família, presentes na Constituição Federal, bem como, pelo princípio da afetividade constante na doutrina e jurisprudência Pátria, dando guarida e o reconhecimento às novas entidades familiares em função da filiação.
As pessoas passaram a buscar incessantemente através da formação das famílias o afeto e a felicidade, independente dos laços de ancestralidade ou descendência, sendo a Filiação socioafetiva prova e manifestação desta construção da realidade fática.
Na interação socioafetiva se verifica que pai ou mãe não é apenas aquele que transmite a carga genética ao filho, nem quem exerce essa função cotidianamente, porque, mesmo sendo padrasto ou madrasta e existindo uma relação saudável com o enteado, pode não estar caracterizada uma parentalidade socioafetiva, diante de uma relação saudável com o pai ou mãe biológico.
A paternidade ou maternidade socioafetiva está presente numa relação em que haja respeito e proteção dos envolvidos, e acima de tudo amor e afeto entre os pais afetivos e seus filhos.
O reconhecimento dessa parentalidade socioafetiva produzirá efeitos pessoais e patrimoniais, em igualdade de direitos e deveres aos da parentalidade genética, em relação aos pais e aos filhos.
Promovendo o Reconhecimento da Filiação socioafetiva no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais mais próximo
O Conselho Nacional de Justiça com base no Código Civil, interpretação doutrinária sobre o direito de família e as reiteradas decisões dos tribunais, regulou a matéria sobre o reconhecimento da filiação socioafetiva com o Provimento nº 63 de 2017, que foi alterado em parte pelo Provimento nº 83 de 2019.
Estabelece referida normativa que, o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva deve ser efetivado de forma voluntária perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, mesmo que seja diverso daquele em que foi lavrado o assento de nascimento.
Importante esclarecer que, o ato voluntário de reconhecer a filiação socioafetiva é irrevogável, e sua desconstituição somente se dará judicialmente, quando provada as hipóteses de vício de vontade, fraude ou simulação.
O requerimento será entabulado perante o Oficial de Registro pelo filho maior de dezoito anos de idade, a ser reconhecido, independente de seu estado civil, e o pretenso pai socioafetivo ou a pretensa mãe socioafetiva, deverá ser pelo menos dezesseis anos mais velho que o filho a ser reconhecido.
Destaca-se ainda quanto ao instituto que, não poderão reconhecer a parentalidade socioafetiva os irmãos entre si nem os ascendentes.
A Filiação socioafetiva deverá ser estável e estar exteriorizada socialmente, por esse motivo o registrador atestará no procedimento a ser formalizado a existência do vínculo afetivo na interação das partes, mediante apuração objetiva por intermédio da verificação de elementos concretos por todos os meios de prova em direito admitidos, bem como por documentos.
Os documentos colhidos na apuração do vínculo socioafetivo deverão ser arquivados pelo registrador juntamente com o requerimento.
Poderão ser apresentados para comprovação, o apontamento escolar, figurando o pai ou a mãe, socioafetivo, como responsável ou representante do aluno, bem como, a inscrição do pretenso filho em plano de saúde ou em órgão de previdência particular ou privada, e ainda, um registro oficial de que os envolvidos residem na mesma unidade domiciliar.
Os pais por afeição podem ainda demonstrar vínculo de conjugalidade, que é o casamento ou união estável, com o ascendente biológico do filho.
Demais disso, outros meios de prova poderão ser, a inscrição como dependente do requerente em entidades associativas, ou fotografias em celebrações relevantes, e, também, declarações de testemunhas com firma reconhecida.
A ausência dos documentos relacionados, não impedirão o registro, porém, a impossibilidade deverá ser justificada, e o registrador deverá atestar formalmente como conseguiu chegar na apuração do vínculo socioafetivo entre o requerente e o pretenso pai ou a pretensa mãe.
Na hipótese do requerente ser menor de idade, serão colhidas as assinaturas do pai e da mãe constantes na filiação, e da pessoa a ser reconhecida a paternidade ou maternidade socioafetiva.
Quando a criança já tenha completado 12 (doze) anos, e sendo menor de 18 (dezoito) anos, conforme estipulado pela normativa, sua anuência deverá constar do expediente também, conjuntamente com as assinaturas do pai e da mãe constantes na filiação, e da pessoa a ser reconhecida a parentalidade socioafetiva.
Se o requerente for maior de 18 (dezoito) anos, havendo a recusa dos genitores de anuir com o requerimento da filiação socioafetiva, não impedirá ou inviabilizará que o procedimento de reconhecimento da paternidade por afetuosidade seja realizado pela via extrajudicial.
Caso não estejam presentes no ato da colheita das assinaturas, a mãe ou o pai biológico do menor, e estando inviabilizada a manifestação válida de vontade destes ou do filho, quando exigido, o caso será apresentado ao juiz competente da circunscrição nos termos da legislação local.
Formalizado o procedimento com as assinaturas necessárias e os documentos comprobatórios, o registrador encaminhará o expediente ao representante do Ministério Público para parecer, e quando do retorno com a concordância da Autoridade, o oficial promoverá o registro da paternidade ou maternidade socioafetiva.
No entanto, se o parecer do Promotor for desfavorável, o registrador não procederá o registro da paternidade ou maternidade socioafetiva, comunicando o ocorrido ao requerente, arquivando o expediente, sendo que, em eventual dúvida referente ao registro o procedimento deverá ser remetido ao juízo competente para dirimir sobre a questão.
Ademais, se o oficial-registrador suspeitar da existência de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade, simulação ou dúvida sobre a interação socioafetiva e a configuração do estado de posse do filho, a recusa será fundamentada, deixando de praticar o ato encaminhando o expediente ao juízo competente.
Destaca-se que, no campo filiação na certidão de nascimento, somente será permitida a inclusão de um ascendente socioafetivo, seja do lado paterno ou do materno, e caso o requerente insista que deva constar o nome de mais de um ascendente no campo pai ou mãe, a solicitação de inclusão tramitará pela via judicial.
Existindo o reconhecimento espontâneo da parentalidade socioafetiva, não obstaculizará ou impedirá a discussão judicial sobre a busca da verdadeira ascendência biológica.
Observa-se que, o pretenso pai ou mãe por afetuosidade, no caso em que os pais biológicos eventualmente se oponham em assinar o requerimento de reconhecimento de parentalidade socioafetiva no Cartório de Registro Civil, poderá intentar a ação declaratória de reconhecimento judicial da filiação socioafetiva em face dos genitores, cabendo ao Promotor intervir observando o Princípio do melhor interesse do menor e garantindo seus direitos, e após sua manifestação, o Juízo analisará a questão e dará sua decisão.
Não sendo resolvidas as questões sobre o reconhecimento da filiação socioafetiva de forma pacífica, poderão os envolvidos no conflito procurar preventivamente pela Mediação, que é um método adequado de solução de controvérsias.
Mediação Familiar e a resolução de conflitos nas questões de Filiação socioafetiva
Válido salientar que, a Mediação é uma modalidade de resolução de conflitos, em que os conflitantes-interessados poderão, com o auxílio de um Mediador, encontrar de forma conjunta a solução ou eventuais soluções, e dentre as possíveis e viáveis qual a melhor para resolver a questão conflituosa que envolvam a Filiação socioafetiva.
Observa-se que, na Mediação Familiar serão procuradas soluções através do diálogo entre as partes, preservando-se o relacionamento dos mediandos, além de viabilizar a intermediação entre os entes familiares, evitando-se mais prejuízos emocionais dos envolvidos.
O acordo entabulado entre as partes-mediandas, contribuirá para que estas promovam a reorganização das vidas pessoais e familiares, e nas sessões de Mediação serão aplicados os meios e técnicas necessárias, para que os conflitantes conjuntamente identifiquem o problema e cheguem à solução do conflito, levando-se o pactuado à homologação.
Quando às partes estejam litigando em um processo, havendo interesse dos conflitantes, esses poderão optar pela Mediação, solicitando aos seus Advogados que peticionem ao Juízo, requerendo que antes de proferida a sentença, sejam as questões relativas ao conflito, levadas a uma sessão de Mediação, para a tentativa de composição, e existindo acordo este será homologado pelo Juiz da causa.
Portanto, na Mediação Familiar os mediandos com o auxílio de um Mediador, dialogarão e conseguirão chegar à solução da questão, preservando e viabilizando as interações dos entes familiares, evitando mais desgastes emocionais dos envolvidos no conflito.
Conclusão
O objetivo da matéria foi dirimir a respeito da Filiação socioafetiva, e sua caracterização em razão da existência de um vínculo familiar de afeto, respeito e proteção, bem como, do requerimento e do processamento perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais.
Elucidou-se ainda, sobre o uso da Mediação Familiar indicando-a como método adequado de solucionar os conflitos provenientes das relações familiares na busca do reconhecimento da parentalidade socioafetiva.
E aí gostou? Quer saber mais sobre Mediação na área de Família?
Dúvidas e/ou Sugestões em: www.apamec.org.br ou contato@apamec.org.br
ANSELMO CALLEJON CORRÊA DOS SANTOS, Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil pela ESA OABSP (2009), Mediador e Conciliador Judicial desde (2016), associado da APAMEC e comentarista do Jornal APAMEC na especialidade de Mediação Familiar. Contato: anselmocallejon@hotmail.com