Mediação e as Modalidades de Famílias
A sociedade e as pessoas atualmente se caracterizam pela diversidade e pluralidade, não sendo diferente do que se dá com a formação das famílias.
Historicamente e etimologicamente a palavra família vem do latim famulus no singular, ou famuli no plural, que quer dizer “escravo doméstico”, no período greco-romano a família era composta pelo conjunto dos escravos pertencentes e dependentes de um chefe ou senhor, sendo ela formada pelo patriarca e seus famulus ou famuli, compreendendo a esposa, os filhos, os servos livres e os escravos domésticos.
No entanto, a família é um elemento ativo, que se modifica e perfectibiliza no espaço tempo, à medida que a sociedade e o direito evoluem, e um novo olhar plural e moderno tem de ser colocado em prática, trazendo luz e cores à nova face de referida diversidade, amplificando o conceito de família, permitindo inclusive o reconhecimento de novas entidades familiares.
Demais disso, a família representa na sociedade, um grupo formado por pessoas, ou um número de indivíduos, ligados pela ascendência, ou pela descendência, em razão de um ancestral comum, ou em virtude do matrimônio, dado o casamento, ou ainda em função da adoção.
Vislumbra-se que, os membros de uma família costumam compartilhar do nome familiar e seus entes estão ligados por múltiplos laços, capazes de mantê-los unidos, moralmente, materialmente e reciprocamente, durante uma vida e as gerações.
Contudo, os indivíduos passaram a entender que nasceram para ser felizes, e buscam incessantemente através da formação das famílias o afeto e a felicidade, e é certo que além dos múltiplos laços, um núcleo familiar só se forma quando existe afetividade, elemento essencial para a sua caracterização, independente da ancestralidade, descendência, ou número de indivíduos que a compõem.
O ordenamento jurídico brasileiro teve que paulatinamente se perfectibilizar e continua se adequando, face a evolução das famílias, e em virtude dessa diversificação pode-se mencionar com base na lei, entendimento dos tribunais e doutrinadores, as várias modalidades existentes e reconhecidas de entidades familiares, conforme segue:
– Família Matrimonial: é a modalidade de família decorrente do casamento, essa união é vinculada a normas, e os cônjuges vivem em plena comunhão de vida e em igualdade de direitos e deveres, tendo entre si um contrato de casamento;
– Família Informal: é a modalidade de família decorrente da união estável, na qual a relação de convivência é duradoura e foi estabelecida entre os unidos, com a finalidade de constituir célula familiar;
– Família Homoafetiva: é a modalidade de família decorrente da união de pessoas do mesmo sexo, essa espécie de família já tem reconhecimento firmado, diante do posicionamento dos Tribunais Superiores, inclusive no tocante ao casamento homoafetivo;
– Família Monoparental: é a modalidade de família constituída pelo vínculo existente entre um dos genitores com seu filho ou filhos, com base no âmbito de especial proteção do Estado, exemplo, é a que tem sua origem nas situações de abandono familiar por um dos ascendentes, ou em razão da viuvez, do divórcio, da adoção, ou dentre outras situações, razão pela qual ela é formada por um dos pais e seu filho ou filhos;
– Família Pluriparental: também conhecida por mosaica, reconstruídas, recompostas ou ensambladas (= montadas), como se usa na Argentina, é a modalidade de família constituída pelo casamento ou a união de pessoas que tragam consigo seus filhos individuais, formando com isso um novo grupo familiar, constituído por duas famílias diferentes;
– Família Anaparental: é a modalidade de família decorrente da convivência existente entre parentes ou entre pessoas, mesmo que não parentes, dentro de uma estrutura familiar com identidade de propósito, exemplo é a família formada entre irmãos, primos, tios ou pessoas que têm uma relação de parentesco entre si, sem que haja a conjugalidade entre elas e sem vínculo de ascendência ou descendência;
– Família Eudemonista: é a modalidade de família identificada pelo vínculo afetivo recíproco de seus entes, independente dos laços biológicos, em que se busca a realização plena de seus membros, havendo consideração e respeito mútuos entre eles, exemplo é a família formada por amigos que vivem juntos no mesmo lar, compartilhando alegrias e tristezas, como se irmãos o fossem;
– Família Simultânea: também conhecida doutrinariamente por paralela, é a modalidade de família formada pela união de duas pessoas simultaneamente a um casamento ou a uma união estável pré-existente.
Válido salientar que, alguns tribunais através da jurisprudência vêm flexibilizando o princípio da monogamia ao dispor ou ponderar sobre o assunto em relação a outros princípios norteadores do Direito de Família, contudo, o STJ entendeu que em:
“(…). uma sociedade que apresenta como elemento estrutural a monogamia não pode atenuar o dever de fidelidade — que integra o conceito de lealdade e respeito mútuo — para o fim de inserir no âmbito do Direito de Família relações afetivas paralelas e, por consequência, desleais, sem descurar que o núcleo familiar contemporâneo tem como escopo a busca da realização de seus integrantes, vale dizer, a busca da felicidade. A lealdade como dever decorrente da união estável (artigo 1724 do CC) e a fidelidade como dever do casamento (artigo 1566 do CC) são óbices para o reconhecimento de uniões poligâmicas para fins do Direito de Família. (…)”. STJ, REsp 1348458/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 25/06/2014.
– Família Poliafetiva: também conhecida por poliamorosa, é a modalidade de família formada pela união entre mais de duas pessoas, independentemente do sexo delas, em que seus entes estão convivendo com interação e reciprocidade afetiva entre si, objetivando a formação familiar. Dentre seus requisitos, reúne os da união estável e da união homoafetiva, as pessoas dessa relação têm conhecimento recíproco de seus entes e consentem com a relação poliamorosa, baseando a interação familiar nos princípios do amor, da ética, da lealdade e da honestidade entre seus membros. A Constituição Federal reconhece apenas a existência de casais monogâmicos, por isso não é possível que cartórios registrem a união poliafetiva, por esse motivo o CNJ proibiu registro dessa modalidade de uniões poliafetivas.
– Família Natural: é a modalidade de família formada apenas por laços sanguíneos, vez que, constituída pelo marido, pela esposa e os filhos do casal, razão pela qual restringe-se a um núcleo familiar específico, ligando-se à ideia de família biológica.
– Família Extensa: também conhecida por ampliada, é a modalidade de família formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade, estendendo-se para além da unidade familiar casal e filhos, sendo exemplo dessa modalidade a configuração familiar compreendida pelo marido, pela esposa, bem como, os filhos, os avós, os tios, os sobrinhos, desde que tenham vínculos de afinidade e de convivência.
– Família Substituta: é a modalidade de família prevista no ECA, na qual uma criança ou adolescente será introduzida em nova família por intermédio da guarda, tutela ou adoção, sendo que referida inserção em família substituta será precedida da preparação e acompanhamento realizado por profissionais especializados, e as crianças ou os adolescentes ficarão convivendo com essas famílias substitutas até que sejam esgotadas todas possibilidades de reinserção nas famílias naturais ou que os menores sejam aceitos pelas famílias extensas.
Percebe-se que, ao longo do tempo as famílias e seus conceitos mudaram, e nas palavras de Engels temos que: “A família é o elemento ativo; nunca permanece estacionária, mas passa de uma forma inferior a uma forma superior, à medida que a sociedade evolui de um grau mais baixo para outro mais elevado” (ENGELS, Friedrich – 1984).
Verifica-se ainda que, as interações e as questões familiares nem sempre se resolvem de forma pacífica, por essa razão as pessoas envolvidas nos conflitos relacionados à divórcio, reconhecimento e dissolução de união estável, divisão e partilha de bens, pensão alimentícia, convivência e regulamentação de visitas, guarda dos filhos menores, investigação de paternidade, tutela, curatela, adoção, e demais assuntos familiares, poderão preventivamente procurar pela Mediação Familiar, que é um método adequado de solução de conflitos.
Como a Mediação Familiar ajuda na resolução de conflitos das diferentes modalidades de famílias?
A Mediação Familiar é uma forma de resolução de conflitos, em que os interessados podem solicitar ou ainda aceitar a intervenção de um terceiro, esse profissional é denominado Mediador, sendo que seu trabalho permitirá que os conflitantes de qualquer modalidade de famílias, tomem decisões por si mesmos, além de encontrarem de forma conjunta, os caminhos possíveis para resolver a questão conflituosa, e dentre eles o que minimizará ou trará a melhor solução duradoura e aceitável às partes.
Referida tratativa estabelecida entre os familiares-mediandos, contribuirá para que estes promovam a reorganização das vidas pessoais e familiares, e nas sessões de Mediação serão aplicados os meios e técnicas necessárias, para que os conflitantes conjuntamente identifiquem o problema e cheguem à solução do conflito, levando-se o pactuado à homologação.
No entanto, se às partes já estejam litigando em uma ação, poderão solicitar ao juiz que antes de eventual sentença, sejam as questões dos autos levadas a uma sessão de Mediação, para a tentativa de composição, na qual os envolvidos conseguirão identificar o conflito, e via de consequência encontrarão eventuais soluções às questões conflituosas, e existindo acordo este será homologado pelo juízo da causa.
Portanto, na Mediação serão procuradas soluções através do diálogo entre as partes das diversas formas de família existentes, preservando-se o relacionamento dos mediandos, além de viabilizar a intermediação entre os entes familiares, dos seus direitos, dos deveres, das questões financeiras, bem como, dos bens dos conflitantes, evitando-se assim, mais desgastes emocionais, procurando acima de tudo ser menos dispendiosa aos envolvidos no conflito.
Conclusão
O presente artigo objetivou esclarecer sobre as várias espécies de famílias existentes, bem como, sua diversidade e pluralidade, além de que, a família é um elemento ativo, que se modifica e perfectibiliza no espaço tempo, à medida que a sociedade, os direitos e os deveres evoluem.
Elucidou-se também sobre o uso da Mediação como método adequado de solução de conflitos e pacificação das famílias.
Ademais, percebeu o leitor que havendo um conflito relativo às questões familiares, independente da modalidade de família, poderão os conflitantes se valer da Mediação Familiar para encontrar a solução de suas controvérsias e resolvê-las de forma voluntária e autônoma.
E aí gostou? Quer saber mais sobre Mediação na área de Família?
Dúvidas e/ou Sugestões em: www.apamec.org.br ou contato@apamec.org.br
ANSELMO CALLEJON CORRÊA DOS SANTOS, Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil pela ESA OABSP (2009), Mediador e Conciliador Judicial desde (2016), associado da APAMEC e comentarista do Jornal APAMEC na especialidade de Mediação Familiar. Contato: anselmocallejon@hotmail.com